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1 Café, seis questões

1 café, seis questões com Fortunato Frederico

11 nov 2022 min de leitura
Fortunato Frederico, fundador e presidente do Grupo Kyaia, é o convidado do 1º episódio da temporada de estreia do podcast '1 café, seis questões', da dipe. Mensalmente, sentamo-nos à mesa com personalidades que se destacam nas mais variadas áreas de atuação na sociedade. No curto período de um café, através de uma conversa descontraída, conheça a pessoa, a sua atividade e as diferentes etapas que o levaram a atingir o sucesso.

Leia a transcrição do podcast:

 

Fortunato, olhando para trás, para aquele miúdo que muito novo foi ao Campeão português pedir emprego e com alguma dificuldade conseguiu o emprego de varredor. Depois, mais tarde, o adolescente que foi cumprir o serviço militar para Angola. E depois o homem que já em Portugal, sem medo, conseguiu dar o passo e abrir a sua primeira empresa. Se hoje pudesse falar com esse “sonhador” da época, que conselhos é que lhe daria para conseguir evoluir mais rápido e ultrapassar algumas dificuldades que o senhor sentiu na época?


Nós nascemos, crescemos e, normalmente os miúdos têm sonhos. E eu, como miúdo, também tinha os meus sonhos, que se foram desenvolvendo com o tempo. E uma das coisas que eu gostava era da fábrica onde trabalhava. Era uma fábrica moderna, que tinha um padrão moderno, um homem que via o futuro e por isso comprava máquinas que ainda não existiam aqui em Portugal. E isso desperta em nós a curiosidade, como quando temos um bonequinho, brincar com o boneco. Portanto foi aí que começou a germinar-se o sonho de ter uma fábrica. Numa conversa informal que tínhamos, quando ficávamos a serrar os ferros para as janelas para o pavilhão novo que o Campeão Português tem hoje. E ele [patrão] passava às vezes ao final do dia e perguntou-me uma vez: “o que é que tu vais ser quando fores grande?” E eu, inocentemente, disse-lhe: “olhe, eu gostava de ser como o senhor e ter uma fábrica”. E ele disse-me assim: “como eu não és porque eu sou grande e tu és de raça pequena, mas a fábrica se trabalhares muito podes tê-la”. E foi aí que surgiu o impulso para no futuro criar a minha própria empresa.
 

Mas tendo em conta as dificuldades que teve e os erros que cometeu, hoje haveria alguma coisa que mudava se pudesse aconselhar “esse” Fortunato Frederico?


O meu conselho é um conselho racional: não corras que podes cair. Tudo na vida tem que ser feito com calma, com perspetivas, com sonhos, mas assente na realidade.
 

"O grupo Kyaia nasce do nome da terriola onde eu estava com um grupo de combate"

Apesar de a Kyaia só nascer em 1984, nos anos 60, quando esteve a cumprir o serviço militar em Angola, já idealizava esse momento em que nasceria a empresa. Depois mais tarde, em 1994, em Dusseldorf, de uma forma astuta, consegue comprar a Fly London. Nesse dia, quando faz essa compra, quase sem contar, sonhava que hoje seria a marca portuguesa de calçado mais vendida no mundo?


Consciência tinha porque era a minha vontade de o realizar. Agora, não sabia as dificuldades que poderia ter ou não ter. O grupo Kyaia nasce do nome da terriola onde eu estava com um grupo de combate. Foi lá que eu pensei mais maduramente, naquelas noites de beber uns copos, de rir, de ouvir o Paco Bandeira cantar. Portanto, havia esta perspetiva de futuro. As crianças fazem-se a sonhar, não é no trabalho duro do dia-a-dia. Eu tinha ideia e preparei sempre o caminho para isto. Regressei ao Campeão Português porque tinha direito ao posto de trabalho, mas depois dei passos consequentes para esse caminho. Fui trabalhar para uma casa de Leiria, a Carvalho & Catarro, que vendia equipamentos para a indústria do calçado, com o sr. Fernando Gonçalves, que era o industrial. Adquiri contactos e conhecimentos nas feiras, com máquinas, com organização de sapatos... Mais tarde fui convidado por dois jovens de Felgueiras para montar uma fábrica [Patrik] e este foi o primeiro passo que eu dei nessa concretização. Eles trabalhavam na fábrica do pai e eu ficava na nossa fábrica todo o dia. Mas eu tive que dar outro passo, porque a sociedade era para ser de uma forma e passou a ser de outra, que não me satisfez. Foi então que eu decidi dar o “gripo de Ipiranga”. Convidei o Amílcar, um jovem que começou a trabalhar comigo aos 15 anos lá na empresa, e ainda o Dr. José Azevedo, o economista da empresa. Rodeei-me de um economista e de um jovem a quem prometi fazer dele um grande industrial. Montei a Kyaia e eles ficaram com 10% cada um.


 

Mas sente que aquele dia em Dusseldorf foi um ponto de viragem na construção do seu legado?


Nós tínhamos a marca Kyaia, mas era uma marca que em termos comerciais não dizia muito. É uma marca de força, a rasgar o mundo e a ir para um planalto. Mas nós para vendermos sapatos precisávamos de uma coisa mais suave. Ainda tentámos várias experiências, mas não dava. Numa feira em Dusseldorf, por mero acaso, a Dona Carolina, a nossa agente para Inglaterra, que era quem estava a preparar o Amílcar para as vendas, disse-nos: “Está ali uma coisa engraçada. Um projeto de uns ingleses que vinham, mas que se enganaram no caminho. Eu acho que aquilo é o que vocês andam à procura”. Quando olhei para aquilo percebi que era mesmo aquilo que eu queria: “já tenho a fábrica, o que eu preciso é mesmo de voar. Está aqui a mosca [alusão ao logotipo da Fly London] que me vai ajudar a voar”. Não olhámos a meios, nem a preços, e decidimos comprar”.
 

Já viajou o mundo, já privou com diferentes chefes de Estado de vários países, exporta os seus produtos para mais de 60 países, e nunca aprendeu a falar inglês...


Às vezes as conveniências levam-nos a isso, e eu não estava interessado em estar a discutir com os meus clientes os defeitos e os atrasos das produções. Queria que alguém fizesse isso por mim. Essa foi a ideia base pela qual nunca me apliquei muito no inglês.
 

"Mas criei para isso uma fundação que vai ser a responsável pela gestão do património"


Depois de tantos anos de trabalho, se hoje sentisse que era o momento de parar e transmitir o seu legado a alguém. O que é que diria, frente a frente, a essa pessoa? Que conselhos, que diretrizes?


Eu infelizmente tenho que fazer isso, porque não tenho a quem deixar o meu património. Mas criei para isso uma fundação que vai ser a responsável pela gestão do património. Essa fundação já tem missões bem definidas para o seu futuro. Eu aos dez aos recebi um prémio da Escola Martins Sarmento, por ser o melhor aluno da Escola de Donim. Foi a primeira vez que eu vi um pequeno filme com bonecos, no Teatro Jordão, e nunca mais me esqueceu isso. O objetivo passa por continuar a apoiar os alunos de Donim, de Paredes de Coura e aqui de Pencelo. E hoje a fundação já faz isso.
 

Sempre deu muita importância à responsabilidade social e criou esta Fundação Oliveira Frederico. Já nos explicou o sei intuito, mas, na realidade, a criação dessa fundação é o verdadeiro legado que o Fortunato quer deixar?

Quero que mais alunos se entusiasmem para a vida, pela cultura e pelo estudo.



Nesta parte final, gostaria de o desafiar a partilhar connosco uma história engraçada, para terminarmos com um momento mais relaxado.

Para mim a história do alemão que vinha a descer a rua é a mais espontânea de todas. Numa feira em Dusseldorf, fui beber uns copos, na companhia do Miranda, do Hélder da Zima e de um industrial qualquer. Vínhamos a percorrer a rua e no cimo da rua vinha um rapaz muito alto, mas vinha “aos esses” também. E quando ele se cruzou connosco, o Miranda, que infelizmente já faleceu, virou-se para ele e disse-lhe: “chega-te para lá ó boi”. E qual é o nosso espanto quando ele levanta a mão para nos dar um murro e diz “vai chamar boi à...”. Nós pedimos para ele se acalmar, dizendo: “desculpe, desculpe, pensámos que era um boi alemão”. Começámos todos na galhofa e fomos beber mais uns copos. Ele era filho de um industrial da têxtil e estava a estudar na Alemanha. É a história mais espontânea e mais bonita que eu tenho.

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